quarta-feira, 14 de setembro de 2011

MPF pede urgência nas punições civis

MPF pede urgência nas punições civis



Procuradorias Regionais dos Direitos do Cidadão são acionadas para investigar crimes praticados durante a ditadura. A força-tarefa faz parte de uma preocupação do órgão em cumprir sentença da Corte Interamericana relacionada aos desaparecidos políticos brasileiros

Enquanto o governo não consegue aprovar a Comissão da Verdade, o Ministério Público Federal (MPF) determinou prioridade na punição civil de agentes responsáveis por mortes e torturas durante o regime militar, além da localização de corpos de desaparecidos políticos. Ofício encaminhado em agosto às Procuradorias Regionais dos Direitos do Cidadão afirma que o entendimento da Procuradoria Federal é de que as violações de direitos humanos devem ser objeto de investigação e de responsabilização.


O documento da procuradoria já surtiu efeito. Na quinta-feira, o procurador da República do Espírito Santo, André Pimentel Filho, abriu inquérito para apurar fatos ocorridos no estado. Ele solicitou ao Arquivo Público Estadual que informe a existência, nos acervos, de material sobre o período e oficiou a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) requisitando informações.


O MPF sugere um "roteiro" para a atuação dos procuradores. Entre os pontos, está a identificação das vítimas (mortos, desaparecidos e sobreviventes) e dos agentes públicos mais citados como responsáveis pelas violações. E ainda a elaboração de um diagnóstico para a busca dos corpos, o mapeamento de sepulturas ou cemitérios, as exumações e a produção de laudos. A presença das famílias em todo o processo é outra exigência da procuradoria. A lista de mortos e desaparecidos políticos por estados e municípios foi incluída no documento.


A circular, assinada pela subprocuradora-geral da República Gilda Pereira Carvalho, ressalta a preocupação de um grupo do MPF com o cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que deu o prazo de um ano para o Brasil investigar e, se for o caso, punir "graves violações de direitos humanos" durante o período militar. Em 14 de dezembro, a decisão da Corte completará um ano e o Estado deverá apresentar relatório sobre as providências que foram tomadas em relação ao cumprimento da sentença. A Lei da Anistia, validada no ano passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), porém, não permite a punição penal daqueles acusados de cometerem crimes durante o regime, mesmo em caso de tortura.




Na pauta


O projeto de lei da Comissão da Verdade deve ser assunto esta semana da reunião de líderes no Congresso. Mas a ordem do Palácio do Planalto é de só colocar a proposta para votação quando tiver certeza da aprovação. A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, desviou do assunto na última sexta-feira. "Não é uma matéria polêmica. Não divide oposição e governo", afirmou, depois de audiência no Palácio do Planalto. A comissão vai investigar violações de direitos humanos cometidas no país entre 1946 e 1988.










Entrevista Diego Garcia-Sayan


Verdade, só com justiça






Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o juiz Diego Garcia-Sayan defende a trilogia "verdade, justiça e reparação" nos processos de transição democrática na América Latina. Segundo ele, a verdade judicial é indispensável para a não repetição das violações de direitos humanos. Em entrevista ao Correio, Garcia-Sayan, que já presidiu o Grupo de Trabalho de Desaparecimento Forçado e Involuntário das Nações Unidas, chama atenção ainda para as históricas desigualdades sociais na América Latina.


O que acontece quando um país não cumpre a sentença da Corte?






O objetivo último do tribunal é uma reparação integral, que inclui medidas de não repetição. E isso leva à necessidade de o Estado adotar medidas efetivas, tocando, em algumas vezes, em aspectos institucionais estruturais. De todas as formas, até que sejam cumpridas 100% das reparações ordenadas pela Corte, o caso se mantém aberto por meio de um processo de supervisão do cumprimento das sentenças.


A Corte só interfere depois de esgotados os recursos internos. O aumento da procura por ela pode demonstrar que os países não estão preocupados com os direitos humanos?






Pelo contrário. Entendo que o aumento é produto de uma maior confiança dos cidadãos no sistema interamericano de proteção dos direitos humanos. Essa confiança tem sido construída através dos anos, já que a Corte tem demonstrado que pode dar respostas certas, claras e concretas às demandas dos cidadãos.


Países que sofreram regimes militares têm mais dificuldade para garantir o respeito aos direitos humanos? Qual é a importância das comissões da verdade nesse contexto?






As ditaduras militares afetam a cultura democrática e instauram práticas autoritárias nas estruturas estatais. As comissões da verdade permitem conhecer os alcances precisos dos abusos cometidos. Essa verdade, por certo, não substitui a verdade judicial, orientada a determinar responsabilidades. A trilogia verdade, justiça e reparação constitui o pilar dos processos de transição da democracia na América Latina.


Qual é a situação da América Latina no contexto mundial?






A América Latina caracteriza-se por ter sociedades profundamente desiguais, onde as violações de direitos humanos são mais comuns. Por essa razão, é importante que os estados se dediquem a resolver os problemas que favorecem as violações dos direitos dos cidadão, como a falta de acesso à saúde, à educação... Não significa que isso não ocorra em outras zonas do mundo, mas, na América Latina, essa é a nossa realidade. (AR)

Alana Rizzo
Colaborou Igor Silveira

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