segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

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Colunistas| 20/01/2013 | Copyleft 

O etarra preso e a questão Battisti

Joseba Gotzon foi preso no Rio de Janeiro por delitos de natureza política. 

No Brasil, ele é apenas um adulterador de documentos. De modo geral, é o mesmo caso de Cesare Battisti, que teve seu pedido de extradição negado pelo STF e, agora, aqui vive tranqüilamente como escritor.

É preciso saber quais foram os trâmites oficiais para que a Espanha enviasse agentes seus ao Brasil, a fim de obter a prisão do cidadão basco Joseba Gotzon, que vivia e trabalhava no Brasil com identidade falsa. A notícia, divulgada em primeira mão pelo jornal ABC, de Madri, é clara: a detenção havia sido feita por agentes da Polícia Nacional da Espanha. Mais tarde, outras versões diziam que a detenção fora realizada somente pela Polícia Federal. 

Se assim foi, seria importante saber se essa colaboração entre a Polícia Federal brasileira e a Policia Nacional da Espanha se faz mediante acordo oficial, aprovado pelos parlamentos dos dois Estados, ou não.

Se não há acordo formal, negociado pelos respectivos ministérios de Relações Exteriores, os policiais brasileiros envolvidos podem sofrer sanções disciplinares. Nesse caso, a Polícia Federal não deve prestar serviço a autoridades estrangeiras, nem a Policia Nacional da Espanha atuar no Brasil, se é que agentes espanhóis participaram da operação, da forma divulgada pelo ABC de Madri.

Joseba Gotzon (seu nome basco) cometeu um crime, que quase todos os fugitivos cometem: o de falsidade ideológica, mediante adulteração de documentos. Por isso, e só por isso, pode ser processado, julgado e, eventualmente, condenado no Brasil. Quanto à sua suposta atuação na luta armada, considerada terrorista pelo governo de Madri, ela não nos diz respeito como Estado.

Há, naturalmente, os brasileiros que são solidários com a luta pela independência do País Basco, que levou milhares de seus cidadãos a manifestar-se, há uma semana, nas ruas de Bilbao, exigindo a transferência dos prisioneiros bascos dos presídios espanhóis e franceses para que cumpram a pena em seu território histórico.

Como há, da mesma forma, os simpatizantes do franquismo que desejam a extinção dos bascos. Ora, o povo basco parece ter sido o primeiro povo a sedimentar-se na Europa, depois das grandes peregrinações, e a fixar-se exatamente onde continua a viver, nos Pirineus, divididos pela fronteira estabelecida pelos franceses e castelhanos, sucessores dos romanos e dos gauleses.

Joseba é acusado de tentativa de morte, por ter atacado policiais espanhóis, que, mesmo feridos, sobreviveram. Esse crime deverá prescrever em uma semana, de acordo com a informação de fontes espanholas. Trata-se, claramente, de um delito de natureza política. No Brasil, Joseba é apenas um adulterador de documentos, ato explicável em sua situação clandestina como foragido.

É o mesmo caso de Cesare Battisti, que, mesmo acusado de falsidade ideológica, e de assassinatos políticos na Itália, não confirmados - desde que, se os houvesse cometido, teria o dom da ubiqüidade, e disparar sua arma em duas cidades ao mesmo tempo - teve seu pedido de extradição negado pelo STF e, agora, aqui vive tranqüilamente como escritor.

Na realidade, o caso Gotzon se explica no contexto dos movimentos políticos pela independência não só do País Basco, quanto da Catalunha, no processo que deverá levar à federalização da Espanha, ou à sua balcanização política. Aos dominadores históricos de Madri, bem como à direita de modo geral, é melhor a luta armada, que lhes justifica a violência e a opressão cultural. Os catalães e bascos (como amanhã deverão segui-los os asturianos, os galegos e os andaluzes) resolveram concentrar-se na luta aberta e política pela independência. Os bascos sabem que nenhuma luta armada consegue êxito se lhe faltar o apoio político das massas.

ETA (Euzkadi Ta Azkatasuna, ou País Basco e Liberdade) decidiu baixar as armas. Seu braço político, Herri Batasuna (Unidade do Povo), ratificou essa posição, ao mesmo tempo em que reafirmava a escolha da ação política. É uma nova etapa histórica, bem mais promissora do que a luta armada, de grupos clandestinos, mesmo porque o povo já está impaciente com o comportamento escandaloso da monarquia, que se reflete na corrupção e na incapacidade de seus atuais governantes. 

Mauro Santayana é colunista político do Jornal do Brasil, diário de que foi correspondente na Europa (1968 a 1973). Foi redator-secretário da Ultima Hora (1959), e trabalhou nos principais jornais brasileiros, entre eles, a Folha de S. Paulo (1976-82), de que foi colunista político e correspondente na Península Ibérica e na África do Norte.

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