sexta-feira, 8 de junho de 2012

"Flores do Oriente" é o nefasto poder de destruição de uma guerra
“Nunca houve uma guerra boa ou paz ruim” foi o auge do pensamento iluminista do abolicionista e antropólogo americano Benjamin Franklin. Nunca uma guerra enriquece ou a morte dignifica. É lutada por homens com defeitos comandados por políticos interesseiros e desde que o mundo é mundo a lógica é a mesma. Foi similar em Nanquim, capital da China em 1937, quando os japoneses tomaram a cidade de assalto e executaram nela um dos maiores massacres da história moderna, com saldo de 100 a 300 mil mortos (números ainda em pesquisa). O episódio é conhecido como “O Estupro de Nanquim”, em referência à brutalidade dos invasores em relação às mulheres – estupros coletivos de mulheres e crianças, abusos sexuais e milhares de civis inocentes mortos. É essa a premissa de “Flores do Oriente”.



A história acompanha um grupo de meninas chinesas que se refugia da guerra em uma igreja católica junto do ocidental John, que só estava ali para enterrar o padre que cuidava do local. Um grupo de prostituas também se esconde na igreja para fugir dos horrores das ruas e nisso John acaba, meio sem querer, assumindo as vezes de padre e protegendo as rebentas. No roteiro está algo que logo de cara o diretor identifica como foco: a redenção do agente funerário na salvação das meninas. Narrado pela jovem Shu, o filme é um retrato fiel e dramático do olhar de jovens inocentes para os acontecimentos.


Produzido com a habilidade natural por Zhang Yimou (dos intocáveis “Herói” e “Lanternas Vermelhas”), “Flores do Oriente” é uma coprodução China-EUA e teve a mão de Steven Spielberg (amigo de Yimou) na montagem do elenco. Tecnicamente impecável, a fotografia de guerra é cinzenta e a câmera nunca é censurada. Os enquadramentos e o trabalho histórico (o filme á baseado no livro homônimo de Yan Geling) denotam a importância dos eventos que até hoje geram faíscas nas relações diplomáticas entre China e Japão, até pela postura de esquecimento dos nipônicos, na qual o assunto foi retirado de todos os livros escolares e é proibido nas ruas
O filme é a soma de muitos aspectos positivos e tira de cada detalhe o máximo. O apelo visual é fiel ao cenário como só Yimou consegue produzir, a história nunca perde o fôlego apesar de se tornar mais dramática com o tempo e ter leves quebras de ritmo, e a música do violinista Joshua Bell acompanha quase toda a trama com sinos de lamentação. Tem lá seus clichês, como o ocidental descrente que se apoia na fé e nas meninas para a redenção ou o herói de guerra que morre para matar o maior número possível de inimigos. Isso, porém, nunca soa infiel ao talento dos envolvidos.



Bale é caricato e forte e traz o talento habitual. As prostitutas e as jovens meninas recebem todo um tratamento visual significativo que destila das atrizes a força que as personagens requerem: às primeiras a força da irreverência e a visão ultraje de mundo, que também pode ser inocente; e às jovens a inexperiência não como escapismo, mas inerente à condição de abandono no meio de uma guerra  Isso amparado pelo jovem monge, que é o braço direito de John.
Os créditos de “Flores do Oriente” estão em ilustrar esse infiel destino de Nanquim às mãos de um nicho refém de toda a guerra. John se transforma em um pária para tirar as mulheres da cidade o mais rápido possível, mesmo tendo que conviver com soldados estupradores e generais cínicos. Há um romance e nesse romance um ponto de nova redenção sob o olhar de uma prostituta. É disso que o filme se trata: encarar diversas visões do massacre sob um ponto comum, o de que crianças não podem presenciar uma guerra. Tampouco prostitutas ou bêbados. Guerra não é para civis.



Yimou, com “Flores do Oriente”, dá mais um passo rumo à sua afirmação enquanto expoente cultural do oriente. Diretor renomado pós-Revolução Cultural Chinesa, o veterano disseca como poucos alguns agouros que vivem no inconsciente de uma sociedade fechada por um regime ditatorial


O “New York Times” chegou a acusar o filme de “um musical backstage - passado nos bastidores - que de vez em quando é interrompido por um desagradável estupro ou assassinato” e associou-o a “E o Vento Levou” pela longa-metragem. Também o acusam de ser melodramático demais, como o inverossímil “Cavalo de Guerra”. Há pouco disso e muita vontade de afirmar “nós nos lembramos do massacre, Japão!”. O recado está dado com o domínio de um Yimou e um final a la Almodóvar.

                              Relação de inocência entre meninas e prostitutas é explorada no filme                
Eriksson Denk

Crianças correm pelas ruas de Nanquim em busca de salva


Na Igreja, vivem prostitutas, um bêbado e meninas do convento
Em "Flores do Oriente", Bale é um "padre" herói

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