Torturados na ditadura ainda esperam por justiça em Minas Gerais
MP começou a ouvir 80 militantes presos no período do regime militar, ou que tiveram parentes desaparecidos
O Ministério Público Federal em Minas Gerais começa a ouvir cerca de 80 pessoas que foram torturadas, presas ou tiveram parentes desaparecidos durante o período da ditadura militar. A instituição abriu inquérito civil público para apurar cinco mortes e um caso de desaparecimento na época do regime. Para quem vive o drama de identificar-se nas terríveis histórias que marcaram o período, a esperança é a de que o MPF consiga punição para os acusados pelo desaparecimento e aponte onde estão os restos mortais dos demais militantes de esquerda.
Nos próximos meses, a Procuradoria de Direitos dos Cidadãos pode abrir mais inquéritos com a mesma finalidade. Na avaliação de fontes que entendem dos casos, a possibilidade de apontar os restos mortais e o dilema na Justiça pode amenizar a dor dos familiares.
O sentimento de vingança tardio apareceu, nos últimos meses, de diversas formas. Em março, uma prisão, ocorrida no Rio de Janeiro, foi motivo de comemoração entre um grupo restrito de ex-torturados e presos políticos. O capitão Guimarães, ou Ailton Guimarães Jorge, foi preso na operação Furacão, da Polícia Federal, acusado de pertencer a uma quadrilha do jogo do bicho no Rio de Janeiro. Ninguém comentou ou falou nada, mas o capitão seria o mesmo que espalhou o terror nos porões da ditadura. “Ele me torturou, torturou Gilberto Gil e Caetano Veloso. É um bandido. Matou muita gente. É um mafioso”, desabafou Marco Antônio Meyer, militante de esquerda, que foi preso na época do regime.
O Ministério Público do Pará apresentou denúncia penal contra o coronel reformado do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura pelo sequestro de cinco militantes da guerrilha do Araguaia, na década de 1970. Na prática, os procuradores entenderam que o crime de sequestro é contínuo e não cabe prescrição. Dessa forma, como os corpos dos desaparecidos não foram encontrados, ainda estariam sob a guarda dos sequestradores. No caso dos mortos é diferente, pois a Lei da Anistia, de 1979, perdoou os crimes cometidos durante o regime militar. A Justiça paraense não acatou a denúncia, porém um recurso no Supremo Tribunal Federal não colocou fim ao caso.
Em Minas Gerais, os inquéritos abertos pelo mesmo Ministério Público Federal podem resultar em denúncias à Justiça, como no caso do Pará, e acabar no STF.
A responsável pelas investigações mineiras é a procuradora de Direitos dos Cidadãos Silmara Goulart. Ela não concede entrevistas sob o argumento de que as ações são sigilosas. “Entregamos à doutora Silmara mais de 80 nomes, com telefones, de pessoas que foram torturadas, presas ou tiveram parentes nessa condição. Ela vai colher todos os testemunhos”, afirmou Betinho Duarte, assessor especial de uma comissão criada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seção Minas Gerais.
Ele também entregou uma lista à procuradora com o nome de 23 desaparecidos políticos mineiros. Destes, 11 militaram na Guerrilha do Araguaia.
A denominada Comissão da Verdade da Ordem dos Advogados também pediu providências quanto à apuração de 23 mortes de militantes mineiros que foram assassinados fora do Estado e outros 16 executados em Minas Gerais.
Amália Goulart - Do Hoje em Dia - 23/04/2012 - 07:59
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